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sábado, 11 de dezembro de 2010

Democracia contra a maré

por Márcio Duarte

Pensemos o seguinte cenário hipotético: Você mora numa cidade que se urbanizou de forma abrupta e as ações do poder público não acompanharam o ritmo das novas demandas. Surgem moradias subnormais e falta de saneamento, precariedade no serviço público de saúde, educação e de outras necessidades básicas são lugares-comuns nas conversas ligeiras de uma fila, desconhecidos no ponto de ônibus, entre amigos ou até dentro de casa. Instaurou-se, com o passar dos anos, uma desconfiança quanto à idoneidade da administração pública do seu município e as pessoas votam mais por obrigação do que por livre e espontânea vontade.

Consequentemente, sua escolha política fica restrita à condição do “menos pior” ou daquele candidato que pouco você conhece sobre sua vida pessoal e trajetória política, preferindo depositar todas as suas crenças e esperanças reprimidas, idealizando àquela personagem que hipnotiza multidões seus slogan e samba-canção fora de época (se bem que hoje em dia já há uma ampliação dos gêneros musicais utilizados, revelando o caráter eclético, democrático e sensível às preferências do seu exigente eleitorado – já notei a presença melodiosa das harmonias refinadas do funk, axé e até mesmo da famigerada mpb).

O ambiente descrito acima lhe parece familiar? Talvez um ou outro detalhe - “Mas eu moro numa cidade do interior que continua interiorizada. Aqui quem manda é a família do coronéeer”. Bom, independente das particularidades de cada município, a indiferença política qualificada é um fenômeno de abrangência mundial, principalmente nos países que se dizem os mais democráticos. Cuidado crianças, sempre que alguém ou alguma coisa faz muita propaganda sobre uma qualidade que deveria ser inerente à natureza de sua função, ou seja, óbvia, geralmente é porque ela ainda não o é plenamente ou não deseja que se discuta sobre. É quase filé com fritas que ao repetirmos um termo (adjetivo, substantivo, predicado etc.) de forma pouco criteriosa acabamos a banalizando. Isso acontece, em parte, porque imprimimos uma variedade de sentimentos, pensamentos e experiências muitas vezes conflitantes e incoerentes, gerando uma confusão cognitiva. Para a nossa consciência profunda, repetir uma mentira mil vezes até que vire verdade não acontece, pois em algum momento essa tensão encontra uma forma de escape e muito provavelmente será patológica (em forma de doença, degeneração, corrupção de um ideal). E a indiferença – salvo em condições de total desconhecimento do assunto - nada mais é do que uma frustração muito profunda, um interesse adoecido.

Voltando ao foco principal do texto, pergunto: o que você entende por democracia? E política? E eleições? Provavelmente uma série de adjetivos pouco agradáveis veio à sua mente junto com um desgosto pelo assunto. Calma, não criemos pânico. Há uma luz no fim do túnel. Na verdade, várias.

Uma das possíveis válvulas de escape a esse desgosto, a essa revolta e indiferença – aliada aos efeitos concretos da ineficiência pública de gestão do município, estado, nação e mundo – pode ser criativa e profilática (que evite a doença ou sua propagação). Um bom exemplo aqui mesmo no Brasil nos é dada por um pequeno grupo de Ribeirão Bonito, interior de São Paulo. Reconstruindo o significado de democracia, representação política e utilidade pública para o município, moradores daquela pequena cidade que se fez grande fundou uma associação em forma de ONG cujo objetivo era fiscalizar como seus dirigentes políticos gastavam seu dinheiro. O incentivo deu resultados e hoje a participação política da população cresceu em milhares de por centos (dados próprios), tendo como produtos uma cartilha de combate à corrupção, dezenas de associações similares espalhadas pelo Brasil e a prisão de figuras políticas locais cuja improbidade administrativa (má fé na utilização dos recursos) foi comprovada.

A fiscalização da população é uma ideia simples e uma garantia de efeitos até agora subestimados. Ela encontra fundamento numa das definições da democracia para a ciência política (vide Robert Dahl na sua obra Poliarquia), onde “uma característica-chave da democracia é a contínua responsividade do governo às preferências de seus cidadãos, considerados como politicamente iguais.” Ou seja, o dever dos eleitos de aplicarem os recursos públicos da forma mais eficiente, eficaz e eficiente possível, tendo como critério fundamental a necessidade expressa da coletividade em forma de consulta à sua população. Um governo que serve, e não que é servido.

Participando das audiências públicas e sessões ordinárias da câmara de vereadores do município, os moradores de Ribeirão Bonito parecem ter conseguido dar enormes saltos na melhoria da qualidade de vida da cidade, ou pelo menos na saúde política local. Lembrar em quem você votou ou ainda mais, o que o seu candidato está efetivamente fazendo com a função que lhe foi delegada são medidas que podem ter um papel transformador nos seus conceitos, preconceitos e realidade de milhares de pessoas. É claro que a democracia não se resume a essa dimensão e que também é preciso se pensar em soluções, além de simplesmente fiscalizar. No entanto, num país cuja mídia se detém somente em escândalos políticos e sátiras da indiferença, qualquer passo é grandioso num terreno inexplorado pelo cidadão comum”. Este vai construindo seus próprios significados para os termos que antes lhe eram conhecidos só pelo nome, incorporados de forma mecânica e vazios de conteúdo coerente com a realidade.

Segue o link da ONG que inspirou esse texto. Lá você poderá baixar a cartilha e ter mais informações sobre a história de Ribeirão Bonito. Meu desejo com este texto foi mostrar que há alternativas e podemos – e devemos – participar.

ps. Caso haja algum leitor de Ribeirão Bonito ou cidade com história parecida, por favor, não deixe de comentar as suas opiniões e visões sobre o tema.

2 comentários:

  1. Márcio, gostei muito do texto.
    Temos que,além de refletir o nosso papel dentro desse processo que se chama democracia, tomar iniciativa de se movimentar e exercê-la em sua plenitude. Quem nunca teve vontade de raspar o bigode do sarney qye dê o primeiro passo !!
    Forte Abraço !

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  2. por que será que é mais facil ajuntar uma grande mutidão para se fazer guerra de alimentos em praça publica do que para uma manifestação contra o aumento desproporcional do salário do legislativo? perguntas sem respostas!!!!!!!!!!!!

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